quarta-feira, 12 de março de 2025

O tempo parece que não para, mas ela parou

 




Decidiu que ia  escrever um livro para aquele que a tinha abandonado. Chamaria "Cartas a". Queria isso porque  já  era tempo de  se  livrar de tudo aquilo. Embora  tentasse  há  tantos anos fazê-lo, mais ou menos sete anos e meio, e ainda  não tinha  conseguido  efetiva conclusão. Tanto tempo e  pouco tempo. No decurso de tudo isso uma Pandemia me disse ela, o que fazia o tempo não  ter uma clareza de passagem, mas passou. Ele, ela  sabia, que  havia se dado em vários outras  relações.  

Jamais  ele  deixou de   procurar em várias  bocas e corpos aquilo que tamparia seus  vazios.  Ela  disse isso a ele. Mas tudo que vivera depois dela não tinha talvez o mesmo compromisso que  agora, quando ele apresentava à família a pessoa da  vez. Já teve casamento para  rede social, mas para a família não tinha apresentado ninguém. Se isso significa   amor eterno, compromisso e todo o resto, está então feito. Família Margarina na foto do perfil.

Mas as  cartas  dela não são de censura a ele. Não, ela  acha que ele tá  certo, porque  com a  carência que ele  tem, não lhe restaria nada mais a  fazer.  Mas  ela  sabe que só agora  entendeu a carência  dele. Antes ela  não sabia, ela  não via. Pouco observadora e desligada. talvez  pensando também no próprio umbigo. 

Entretanto, ela  precisa falar-lhe, ela talvez precise  ainda  falar para ele tudo, tudo que não teve coragem, por ser também orgulhosa. 

Quando durante esse tempo decorrido eles tiveram uma pequena recaída, quando ele a beijou e passaram mais algumas noites juntos, ela  não lhe conseguiu dizer o qual prazeroso foi. O quanto ela   o amou plenamente naqueles dias de entrega. E nem ele entendeu, ou ele teve medo de se entregar, embora tivesse sido ele a dar a partida com um beijo.   

Tudo isso é contexto de  suas cartas, que trazem um lamento de  alguém que ama e não é correspondido, alguém que está cansado de sentir o que  sente, que se esgotou de um sentimento infantil, que pensa  racionalmente na dependência que  esse amor lhe causou que  ela  não conseguiu entender até a  escritura das cartas, onde mostra que já perdeu a esperança, achando que ninguém mais vai aparecer, que ela não tem um caderninho de EX para acionar quando sozinha como ele  faz.

Contextualizada a questão vamos às cartas:


"Hoje senti tanta saudade, foi uma espécie de  nostalgia de algo que  eu não saberia explicar. Eu sei que você sequer tem   lembranças de mim no seu dia-a-dia, mas eu não passo um dia que não me lembre de  você todos os dias. Tem  dia  que  choro ainda, mesmo depois de tantos anos. 

Acho realmente que  durante 5 anos eu embotei todo esse  sentimento. Dizia para  mim que não te amava, mas era mentira. Dizia e aceitava tudo que você fazia de  longe. Te ajudei o que  pude, perto ou longe, sabendo que você estava em outras relações por várias  vezes.

Não sei porque  eu fazia  aquilo, talvez na esperança de  você  reconsiderar a decisão de ter me abandonado, de ter fugido me deixando com a bola quente na mão.  Eu sei que para sua  fuga você  criou uma narrativa desconsiderando tudo, sem me consultar e sendo egoísta como se  só você  tivesse sofrido com o que aconteceu, por culpa exclusivamente  sua.

Eu jamais falei isso, mas toda  culpa  foi sua. Eu te defendi o tempo todo, para  todos,  julguei que  você  estava  doente para  te mandar para casa, mas tudo para te  proteger. Mas você jamais entendeu.  Você conseguiu em uma semana sair do " quero casar contigo" para  "deixa-me  viver em paz". Não sei se esperando que eu  não deixasse e te  pedisse para reconsiderar, mas  eu estava tão esgotada com todos os  problemas que por sua causa eu tive, que  não tive como pedir. E você  ficou com raiva,  me ignorou ficou magoado comigo e  arrumou a primeira  Ex, que  só fui saber um ano depois.

Não te disse isso, porque acho que  você  negaria. A sua  mania é de  testar o amor do outro, com todas. Acho mesmo que  a atual deve estar  vivendo isso.

Quando você vai crescer, nunca? Por que diz  ser amigo quando não consegue isso? Que tipo de homem é  você, que  criança  carente é você?

 Eu te resumi em uma mensagem que  você agradeceu, e  eu disse que não ía te chamar mais, com convicção. Mas eu não consigo. Vez por outra te interpelo e vejo seu silêncio e desprezo. Cheguei a pensar em que  merda eu tinha feito para merecer tal castigo. Mas você  disse que não, que era o trabalho que  o estava a consumir.

Então, essa  é  minha última esperança de  me despossuir desse amor adolescente, que me consome para além da  minha Razão".


A cada  carta que leio  dessa personagem talvez fizesse inúmeras considerações, mas não sou psicóloga, apenas transcrevo o que para  posteridade pode vir a ser uma narrativa diferente. Lembrei-me de Rahel, a personagem de Hanna Arendt  ou de um outro livro que li, que por  uma carta a personagem principal se livra de  toda  uma gama de sentimentos. Vamos ver se assim ocorrerá com nossa personagem em suas  recaídas  solitárias de  paixão.             


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