terça-feira, 22 de maio de 2018

Procura-se uma cidade




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Tenho pena, tenho pena das cidades que se desfazem no tempo. Desde criança queria ser  viajante.  Alguém  que perambula pelos lugares mais diversos observando, vendo, sentindo sua energia. Agradava-me pensar no ser nômade, em busca de comida e sensações. Talvez um Flanêur ou um Marco Pólo desbravando os espaços perdidos. Cidades da imaginação, invisíveis e visíveis, todas  querendo se mostrar para o descobridor.
No entanto esse descobridor o que busca , não sabe. Riquezas, fortuna, cultura, amor, o que? Quando chega  na cidade nova, lembra de imediato da sua, como diz o poeta lembra “ do rastro de sua  cidade no tempo”, mas  quando volta à sua  cidade o que vê não é mais o que lembrava, é uma outra cidade,deformada por seus moradores, cidade que não  quis  envelhecer, e que se transforma monstruosamente.
As casas são outras, os moradores são outros, as praças desapareceram, as pedras foram trocadas, ou morros ocupados desregradamente.
Procura-se uma cidade. Aquela da lembrança das fotos no solar. Da lembrança dos  moradores antigos, aquela  que lutava para aparecer e  que sobrevivia ao progresso desenfreado que não leva a nada.
Mangaratiba...
Seu rastro no tempo amarelou, ficou drumondianamente,  pregado na parede das casas, ou no museu do solar.
Suas  praças deram   lugar aos carros, um estacionamento.  Carro vale mais que gente sentada sob a arvore pegando fresca. Seu trem também foi comido pelos carros. Sua mata de contorno vai sendo arrancada pelos invasores  que não se importam com a sua beleza. As fachadas, AH! As fachadas, letreiros enormes apagam suas datas de nascimento, seus desenhos de estuque, sua estatuas de enfeite, até a igreja de Nossa Senhora da Guia agora tem galhardete na frente, enfeiando seus últimos azulejos portugueses, colocados na sua construção  .
    Onde está minha cidade, onde está minha igrejinha branca e dourada, que se identificava com todos que tinham pelo menos 100 anos.
 Minha cidade sumiu, não foi inundada pelas águas, foi inundada por uma onda feia, que descaracteriza, que se desmaterializa  da memória em busca do lucro.
Não mais  a reconheço. Percorro por meia hora suas ruas. Na pressa de tirar  ainda  fotos do pouco  que restou da  cidade antiga. Pior que derrubar  é  arrancar os pedaços, a morte é lenta, dolorosa. Quando matam de vez, como fizeram com São  João Marcos, a lembrança que fica  deleita a memória dos vivos. Mas quando  transformam a cidade num Frankstein não tem jeito. Só mesmo apelando para a Senhora da Guia. Tenha piedade de Mangaratiba.     22\01\2013 

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