A morte de Enrique
Job Reynes
Quem era Enrique não interessa, mas sim como este morreu. Tem pessoas
que morrem triste, outras morrem sonhando, morrem de morte morrida ou de morte
matada.
Pero Enrique, nosso personagem,morreu de morte matada, embora estivesse
já há tempo no caminho da morte morrida.
Era primavera, quando as chuvas se intensificam nas tardes quentes que esperam o verão. Enrique saíra
cedo de casa para trabalhar. Trabalhava
toda tarde em seu ofício. Cercado
de jovens ele falava sobre o fim, a morte, o fim das representações ou começo
delas, o fim da vida, os deslocamentos, o fim do mundo. Compartilhava essas
idéias com as pessoas já fazia tempo e suas investigações progrediam. Até que a
idéia de fim, sem que isso levasse a um
novo começo, principiou a fazer parte do repertório intercorrente de seu
pensamento.
Falava, agia, trabalhava, estudava e a ideia ali, não se movia, não
aumentava, nem tampouco diminuía, mas estava ali, a deriva nos entre
lugares de outros pensamentos.
Era um homem reservado, falava pouco, tinha poucos amigos, uma vida
serena em detrimento dos pensamentos conflitados que o torturavam. Queria
entender os mecanismos das coisas e não as coisas propriamente ditas.
Interessava mais aquilo que não era, do que o que era.
Quando a ideia que não se movia começou a fazer parte de seu cotidiano,
ele não se preocupava, achava que não pensava o que de fato pensava. Se
perguntado sobre a ideia, desconversava porque
não era a sua provocação.
Todavia a ideia estava ali, submersa em outras questões, escondida por
sob os papéis, disfarçada em outras palavras, sempre a espreita. Até que
naquele dia, que era de primavera,
e chovia muito, Enrique, depois de passar na casa de Delmira, sua amante, mas
que não faz parte da história, saiu do mundo das representações do fim e fez
seu próprio fim. Morte matada para os jornais.
Enrique
Job Reynes, que outrora matara Delmira e depois se matara, dá cabo da
própria vida deixando a amante livre
para criar a história dos dois.
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