sexta-feira, 2 de março de 2018

Sebastiana veio me visitar

Sebastiana chegou cedo dessa vez. Me esqueci que era sexta feira, dia de minha liberdade e quando ela se incorpora para suas atividades domésticas. Posso dizer que ela às vezes vem  a toda,outras vem meia bomba.
Tudo bem, eu entendo que não é a melhor coisa do mundo passar aspirador, pano molhado, limpar aquelas coisas que ficam grudadas nos móveis brancos e que sempre estarão por lá, limpemos ou não.   Ela começa sempre pelo quarto. Liga a palestra da Monja Coen e vai dobrando as roupas da semana e as que lavou no dia anterior.  Não passa a ferro .  Não, esse objeto é exceção na casa.  Somente em estado de sítio ele surge.
Termina as roupas põe no armário e pega o novo aspirador vertical que não dá dor no quadril.  Na falta de grana para um que funciona sozinho por robô, esse quebra um galho.
Depois do  aspirador o pano úmido com cheio cheirinho para acabar com os tufos de poeira. Troca os lençóis,  arrisca uma colcha nova bem bonita e divertida , porque hoje tá querendo alegria  e arruma as novas luzinhas vermelhas que colocou sobre a cama. Até que dá um clima.
Depois vai aos outros cômodos.   Sempre tem cabelo por todo lado, por isso o aspirador é o principal.
Sebastiana  faz as coisas em silêncio.  A vida vem passando na mente enquanto limpa, enquanto tira o pó e  arruma as coisas. Mesmo sendo sozinha  sabe dessa necessidade.  Lembra de pessoas que passaram aqui, olha armários que precisam ser mexidos e  coisas que precisam ser esvaziadas.  Abrir espaços é importante, abrir e deixaŕ limpo para outra fase da vida.
Limpar a chaminé  é o que li,  no livro cujos personagens são Freud e Nietzsche.  Trabalho que tem que ser feito sempre sob pena do fogo não acender pelo acúmulo de detritos.
Penso que é mesmo assim,  que as metáforas servem para tudo . E tudo que vemos com atenção nos serve em algum momento da vida. Mas tem que estar atento.
Silenciosamente Sebastiana, tal como a de Stella Manhatan, vai tecendo sua rede. Vem a mente o dia anterior , quando   fez a fachina semanal do psicólogo.
Aqueles  que acham que tem toda a razão sobre o sentir dos outros.  Os mesmos que se acham  no direito de   pontuar tudo que você faz de errado e que você pensa de errado, e ainda são pagos por nós para isso.
Eles são feras nisso. Mas nem sempre estão certos. Certa feita as pessoas se enchem  e os mandam catar coquinhos. Talvez essas horas sejam as que eles mais acertem.
Aceitar,diz Sebastiana, palavra mágica. Todavia com duplo sentido.
Preferia azeitar, passar azeite para ficar mais liso e escorregar com as coisas da vida.
Talvez aceitar pressupunha  um certo grau de conformismo. Será?   Parece com aquilo que não se luta,que não se briga para ser e estar e ter.
Talvez não seja muito do nosso perfil , nem meu ,nem de Sebastiana.
Aceitar a posição do outro e aceitar a sua própria posição.   A fachina precisa ser feita. Precisa tirar o que ficou de excesso do sabão em pó.  Tem que passar água várias vezes e só depois de muita limpeza da para ver o que resta. 
Se ficar limpo mesmo, cabe de novo restaurar o uso. Se ficar mais ou menos, pode ter problemas futuros.
Na verdade Sebastiana fala  que a limpeza tem que ser feita em fases porque tá muito incrustado.  E não sairá tudo de uma vez.  Penso se jogo logo fora e invisto em outro ou espero as fases para desencrustar/desencantar.
Jogar fora é sempre mais fácil. Aceitar . Não jogar fora exige mais estudo, tempo, saber se vale a pena, ter plena convicção de que pode ser mais bem apreciado depois .
Sebastiana me deixou em dúvida, o que não é raro.  Descartar tudo e ir em frente, ou ir limpando até luzir.
Pela ótica da liquidez pós moderna é descarte.  Mas,como sou mais do século XIX,  esse descarte me incomoda, é mais lixo,é mais  dor e talvez menos compreensão.
Sebastiana tá quase na hora de finalizar, tudo  está caminhando, de um jeito ou de outro a vida seguirá.  Aceitar ou azeitar, no fundo  não fará grande diferença.
A escrita vai ficar, as metáforas virão e irão,  tanto faz.  Importante mesmo é não se incomodar com isso além do necessário, que o resto fluirá por si só.

 

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